terça-feira, 3 de julho de 2012

Troque um hábito ruim por um bom

Um artigo interessante foi publicado na Revista Galileu, de junho de 2012. A chamada de capa era "troque um hábito ruim por um bom". Ele me fez pensar que, numa época em que reinventar a rotina e temas como qualidade de vida, motivação e criatividade são constantemente debatidos, a reavalição de nossos hábitos culturais continua estagnado.
Assim como fomos treinados para trabalhar e sermos bons profissionais, para atingirmos um igual patamar em nosso tempo livre, precisamos estar constantemente nos atualizando sobre assuntos ligados ao cinema, à música, ao teatro, à dança, enfim, às artes em geral. Difícil? Trabalhoso? Acredito que não. Falta apenas (um pouco de) treinamento. Nunca tivemos este tipo de educação. Não é à toa que, por essa razão, nosso cérebro não esteja programado para perceber a importância de investirmos em nossas horas de lazer. Abaixo reproduzo alguns trechos da matéria escrita por Sílvia Lisboa e, no final, o link para a matéria completa.

"Nos últimos anos, pesquisas vêm mostrando que o caminho para se livrar de um mau costume não é tentar eliminá-lo, mas trocá-lo por um bom. “Se você consegue diagnosticar seus hábitos, pode transformá-los no que quiser”, diz Charles Duhigg, jornalista americano que compilou os mais importantes estudos sobre o tema em seu recente livro The Power of Habit: Why We Do What We Do in Life and Business (O poder do hábito: por que fazemos o que fazemos na vida e nos negócios, ainda sem edição no Brasil).
Pesquisas mostram que não é verdadeira a máxima de que mudamos pouco ao longo da vida. É possível deixar para trás comportamentos que nos incomodam — como assistir à TV até de madrugada, tomar café demais ou enrolar no trabalho. Basta seguir alguns conselhos cientificamente comprovados.

No cérebro, os hábitos formam rotas neuronais bem sedimentadas, feitas justamente para não serem alteradas. “Em teoria, o sistema do hábito está imune à razão e emoção, ocorre de forma independente e é resistente à mudança”, diz Claudio Da Cunha, biólogo da Universidade Federal do Paraná (UFPR), líder de uma das pesquisas mais citadas nesse campo.  
Um estudo com 1.024 universitários feito na UFSM mostrou como um hábito ruim, comer demais, se torna inconsciente. Primeiro, os pesquisadores fotografaram e pesaram os pratos dos estudantes no Restaurante Universitário. Seis meses depois, enviaram 4 fotos dos pratos por e-mail para 209 voluntários e pediram para que elegessem um deles.
Dentre os 77 que responderam, a maioria com sobrepeso e obesidade escolheu o mesmo prato de meio ano antes. “Isso mostra como o hábito de comer aquela quantidade e tipo de alimento está tão arraigado que a pessoa não tem mais juízo crítico”, diz Da Cruz, líder da pesquisa. “É por essa razão que a maioria dos regimes não dá certo, pois pressupõe mudança de comportamentos inconscientes.” Um hábito é fruto de um aprendizado. E mudá-lo requer outro aprendizado capaz de promover o nascimento de novos neurônios. Para isso, é preciso mais do que querer" 

Domenico De Masi afirma que a criatividade nasce das diferenças

Em entrevista concedida em julho de 1999 a Roberto D´Ávila, Domenico De Masi fala, entre outras coisas, sobre o efeito da globalização na criatividade.
Em suas reflexões fica claro o papel do "tempo livre" como espaço fundamental para nossa formação tanto pessoal quanto profissional. Se, em muitos casos, nosso trabalho nos força a sermos especialistas, é necessário, cada vez mais, exercitarmos nossa diferenciação quando "não temos nada para fazer". O treinamento para "aprender a filmes menos comerciais", "exercitar o contato com a arte contemporânea", mais do que ampliar os conhecimentos, nos ajuda a sair da rotina e a valorizar nossas folgas. Ouço muito a frase: "quero ir a cinema e ver um filme para não pensar". Esta é uma postura recorrente e que demosntra nossa falta de criatividade em uma das horas mais importantes da vida: a da diversão.
Abaixo reproduzo trecho da entrevista:
"Nessa globalização, nosso modo de pensar vai mudando. Já estamos globalizados em tudo. Nossa visão está globalizada. No mundo todo se vêem as mesmas coisas. Nossa audição também, em todo o mundo se ouve a mesma música. Nosso paladar está globalizado: todo mundo bebe coca-cola, todos comem hambúrguer, Até em Porto Alegre, um dos lugares com a melhor carne do mundo, temos o McDonald’s e todos comem hambúrguer e batatas. Assim como em Nápoles, Paris ou Tóquio.Todos os aeroportos têm o mesmo cheiro, todos os hotéis de uma cadeia, todas as farmácias. 32 milhões de garrafas de coca-cola são vendidas por hora no mundo. 18 milhões de hambúrgueres são consumidos. Assim, essa globalização já está cobrindo todo o planeta. Com tudo isso, a criatividade fica em dificuldades, isso porque a criatividade é baseada nas diferenças. Ela nasce dos desníveis; é como a energia de uma cascata que nasce do desnível entre as áreas alta e a baixa do rio. A criatividade precisa de um desnível"

Guerrilha do tricô estimula a criatividade e a aceitação do imperfeito

A chamada guerrilla knitter, ou "guerrilha do tricô", nasceu nos EUA como uma forma leve de protesto. E hoje ajuda a colorir os locais e monumentos públicos também do outro lado do Atlântico. 
O que pode parecer uma brincadeira na verdade é um movimento político. Verena Kuni, professora de Cultura Visual no Instituto de Educação Artística na Universidade Goethe, em Frankfurt, explica que a guerrilla knitter é uma forma leve de protesto.
"Ela alivia o ambiente", diz Kuni. "Quando as pessoas ficam mais relaxadas e passam a prestar atenção ao que elas veem, podem até achar isso engraçado ou ficarem surpresas num primeiro momento. Mas depois elas começam a perceber que há alternativas para as normas."
A guerrilha de tricô também tem um elemento de enclausuramento, explica Kuni. "As pessoas querem se retirar do mundo real e entrar num mundo onde tudo é mais aconchegante, onde a qualidade realmente importa; um mundo no qual as pessoas verdadeiramente produzam com as próprias mãos", diz ela.
Os guerrilheiros do tricô também aprendem muito sobre velhas técnicas usadas por suas avós. E muito é aprendido sobre o processos de produção, o que pode ter implicações políticas, acrescentou Kuni.
Para os cientistas culturais, essa tendência "faça-você-mesmo" é mais que uma moda passageira. Por trás dos postes, galhos de árvores e bancos de parques cobertos com cachecóis, chapéus ou polainas, há a vontade de se criar com as próprias mãos para produzir algo único e de valor.
"O fato de o produto final não ser perfeito – ter uma parte meio desfiada ou uns pontos tortos – faz com que tenha mais charme", acredita Kuni. Essa aceitação do imperfeito torna mais fácil superar inibições e colocar aquela luva tricotada em casa no parquímetro da esquina.


segunda-feira, 9 de abril de 2012

A nova fórmula do profissional de sucesso

A revista Isto É, do dia 04/04/2012, edição nº 2212, teve como matéria de capa o tema "A nova fórmula do profissional de sucesso". No texto assinado por Débora Rubin, ela afirma: "Esqueça tudo o que você aprendeu sobre o mercado de trabalho. Estabilidade, benefícios, vestir a camisa da empresa, jornadas intermináveis, hierarquia, promoção, ser chefe. Ainda que tais conceitos estejam arraigados na cabeça do brasileiro – quem nunca ouviu dos pais que ser bem-sucedido era seguir tal cartilha? –, eles fazem parte de um pacote com cheiro de naftalina. O novo profissional, autônomo, colaborativo, versátil, empreendedor, conhecedor de suas próprias vontades e ultraconectado é o que o mercado começa a demandar".
Durante a leitura, não pude deixar de constatar o quanto os profissionais da atualidade precisam conviver com conceitos que até então faziam parte apenas da rotina dos artistas: experiência, instabilidade, criatividade, inovação, superação, jogo de cintura. Mais do que isso, a autora enfatiza que a vivência de cada um é mais importante que o conhecimento especialista. Isto quer dizer que, cada vez mais, a qualidade do seu tempo livre vai afetar seu desenvolvimento profissional. Hoje em dia, acontece justamente o contrário: o excesso de trabalho compromete nosso horário de lazer e acabamos confinados aos programas culturais "para não pensar", às mesmas músicas, aos mesmos restaurantes e prestigiamos apenas aos eventos alardeados na grande mídia (muitas vezes de qualidade duvidosa).
O tempo livre passa a ser algo tão fundamental que ele afeta pelo menos 3 das 8 habilidades mais valorizadas pelos empregadores (veja quadro abaixo): Multicultural, Útil e Inovador, Transdisciplinar. "Quando não se tem nada para fazer", a arte (cinema, literatura, teatro, música etc) nos incita a exercitar a inovação e a criatividade de modo lúdico e prazeroso. É uma oportunidade de nos conhecermos melhor e aos que nos rodeiam. Aprender a apreciá-la não é uma obrigação, mas um direito.



PINA BAUSCH: Considerações sobre a líder e a artista, por Tom Lisboa


“Dancem, dancem, do contrário  estamos perdidos”.
(Pina Bausch)

Uma das condições impostas por Pina Bausch para que Wim Wenders fizesse um filme a seu respeito foi a seguinte: não quero que seja biográfico. De fato, a obra que podemos ver hoje nos cinemas (e em 3D) fala mais sobre o legado desta coreógrafa alemã que marcou a cena da dança mundial do que sua vida privada. No entanto, a vida de Pina está presente em cada cena. Ela construía sua arte a partir da realidade do dia a dia, dos acontecimentos nas ruas e do que via nos países que visitava em suas turnês.
Muito da inspiração vinha também da vivência dos próprios bailarinos. Aliás, é a partir da memória das pessoas que dançaram suas coreografias que boa parte do filme se estrutura. O diretor opta em fazer um documentário com duas linhas de ação. A primeira é visual. Nesta parte assistimos criações individuais dos bailarinos que desenvolveram movimentos para homenagear a coreógrafa. Afinal de contas, como a própria Pina afirmava “para tudo que as palavras não conseguem expressar, existe a dança”. Mas a palavra não fica de lado e é através de depoimentos que podemos averiguar não apenas seu lado criativo, mas o tipo de líder que inspirou os membros de sua companhia por décadas. Entre as declarações de Pina posso citar: “Eu não estou interessada em como eles se movimentam, mas o que os move”; “Dança é mais do que técnica. Nós precisamos esquecer de onde os movimentos vêm. Eles nascem da vida. Quando se cria um novo trabalho, o ponto de partida precisa ser a vida de hoje, não algo pré-existente”. E entre as dos bailarinos: “Ela me ensinou que a fragilidade (física) que eu tenho é meu diferencial, minha força”; “Um dia ela chegou e me disse que eu precisava enlouquecer mais, ou surpreende-la. Ela conseguia ver meus medos e limitações”.
Seu método de trabalho consistia em motivar o elenco, fazer perguntas e estimular as mais diferentes respostas. Eles não sabiam exatamente o que ela queria. “É preciso confiança mútua neste trabalho. Todos precisam ter liberdade, sem nenhuma inibição, de mostrar o que quiser. Se você guarda algo só para você, nada novo vai vir à tona”, acreditava.

Clique aqui e veja o trailer de PINA, de Wim Wenders

domingo, 22 de janeiro de 2012

Pagando o café do próximo cliente

É possível inovar até numa ação tão simples como tomar um cafezinho.
 
Com um espaço aconchegante e que transmite conceito de sustentabilidade, o Ekoa Café criou uma série de iniciativas para que seus clientes interajam mais, como os Livros Livres, na qual é possível ler os livros durante a permanência no Café ou levá-los para casa, desde que deixe um no lugar; o Cliente do Mês, em que o cliente que mais frequentou a casa no período é homenageado com uma história sua no mural; e o Café Compartilhado, quando alguém toma um café e deixa outro pago para a próxima pessoa com um bilhete de mensagens positivas, gerando um ciclo de boas vibrações e deliciosos cafés – feitos com grãos orgânicos.

O projeto Café Compartilhado, que surgiu com muita atenção ao lema “gentileza gera gentileza" traz a oportunidade para o cliente deixar um café pago para a próxima pessoa, com um bilhete com mensagens. Segundo Marisa Bussacos, proprietária da casa, “a inspiração do projeto foi baseada em um livro que se passa na República Tcheca. O cliente além de deixar o café pago para o próximo que vier – e que fica anotado na lousa - pode escrever uma mensagem positiva para compartilhar com a pessoa que ver o crédito anotado e quiser utilizá-lo”. “No fim, o que dá mais satisfação para as pessoas é receber bilhetinhos com poesias, letras de música ou palavras de incentivo, algo sempre positivo e muito simpático!”, complementa Marisa. A gentileza é sempre muito bem vinda em todas as ocasiões da vida e o Ekoa quer partilhar isso com cada cliente.

Freud e a terceira cultura, por Daniel Piza

Comento de vez em quando a proposta da “terceira cultura”, demonstrada em sites como Edge  www.edge.org), que é a de reaproximar a ciência e os conhecimentos propiciados pelas chamadas humanidades (filosofia, sociologia, psicologia, antropologia) e pelas artes e seus críticos. O termo vem do lendário debate entre C.P. Snow e F.R. Leavis nos anos 50, As Duas Culturas, em que foram traçadas as fronteiras entre as duas áreas: a ciência seria cumulativa e criaria melhoras concretas na realidade das pessoas (como a anestesia ou mesmo a maior expectativa de vida atual), as humanidades e as artes não teriam a mesma noção de “progresso” (não se pode dizer que Michelangelo foi inferior ou sabia menos sobre a natureza humana do que Brancusi, digamos) e seriam mais especulativas.

A “terceira cultura” vem gerando ou reforçando diversos produtos, sobretudo livros de neurologistas e biólogos que tentam analisar o comportamento humano do ponto de vista evolucionista (com as descobertas feitas desde Darwin até o Projeto Genoma), nomes como Oliver Sacks, Richard Dawkins, Steven Pinker e António Damásio (que dedicou, entre outros, um livro ao pensamento de Spinoza). Até expressões como “instinto de arte” (“art instinct”) foram criadas para tentar explicar fisiologicamente nossa percepção do que é belo e expressivo. Estudos da linguagem também passaram a ser reivindicados cada vez mais por quem tem familiaridade com escaneamentos cerebrais do que com teorias semióticas e congêneres. É como se o empirismo pudesse tudo.

Méritos e deméritos à parte, o fato é que essa “invasão” da ciência em todos os campos pode dar contribuições muito importantes, mas nem sempre tão importantes quanto eles pensam e, atenção, a tendência é bem menos recente do que eles imaginam. Pense em Freud! Ao contrário da grande maioria dos psicanalistas que o seguiram nos últimos cem anos, doutor Sigmund era médico, um homem da clínica e do laboratório, e sonhava com tempos em que a tecnologia pudesse nos dar mais informações consistentes sobre o funcionamento cerebral. No entanto, é visto como alguém que só tratou da “mente” e não do órgão cerebral, como se não imaginasse que os pensamentos deixassem registro fisiológico.

E onde Freud foi buscar as diretrizes para suas teorias, além do que observava experimentalmente nos pacientes com distúrbios psicológicos a que atendia? Em dramaturgos como Sófocles e Shakespeare e em pensadores como Schopenhauer e Nietzsche. Ou seja, nas artes e humanidades. Em tais criações ele via “insights” geniais sobre o comportamento humano, sobre as contradições da psique, sobre os impulsos sexuais e os estados melancólicos. Para Freud, que comparou o surgimento da psicanálise ao heliocentrismo de Copérnico e ao evolucionismo de Darwin como transformadores da noção do que é o homem e seu lugar na natureza, os gênios das artes e da filosofia eram indispensáveis para a nova ciência. Na atual onda da terceira cultura, nem todos pensam assim. Por isso não pensam melhor.
(fonte: http://blogs.estadao.com.br/daniel-piza/freud-e-a-terceira-cultura/)